Soja

O recente acordo entre Estados Unidos e China, que prevê a retomada das compras de soja americana por Pequim, pode resultar numa perda de até US$ 4 bilhões em receita de exportação brasileira da commodity para o mercado chinês no curto prazo (3-6 meses).


As informações divulgadas até agora sobre o acordo preliminar firmado entre Donald Trump e Xi Jinping no final de outubro, na Coreia do Sul indicam que haveria uma retomada de compras chinesas de soja americana de pelo menos 12 milhões de toneladas até janeiro de 2026, e de 25 milhões de toneladas anuais até 2028.

Esse movimento tende a reduzir a dependência chinesa do suprimento brasileiro, que nos últimos anos respondeu por 70% a 80% das importações de soja da China.

O impacto negativo é moderado nos cenários de risco de especialista ouvido pela coluna: caso o acordo Trump–Xi seja plenamente implementado, com compras anuais de 25 milhões de toneladas, isso pode representar perda de até US$ 4 bilhões em exportações brasileiras destinadas ao mercado chinês.

Para efeito de comparação, a estimativa para este ano era de quase US$ 34 bilhões em vendas de soja brasileira para a China.

Se o acordo for apenas parcial, com média de compras de 15 a 20 milhões de toneladas de soja americana, a perda de receita para o Brasil seria menor, em torno de US$ 2,5 bilhões.

Mas, mesmo entre os produtores americanos, há desconfiança sobre a estabilidade do acordo, considerando a imprevisibilidade de Trump. Num cenário de ruptura e restabelecimento de tarifas elevadas sobre a soja americana, as compras chinesas tenderiam a aumentar novamente no Brasil. E isso poderia gerar ganhos adicionais próximos de US$ 1,5 bilhão para os exportadores brasileiros.

De seu lado André Nassar, presidente-executivo da Abiove (Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais), não menciona valores, mas suas cifras de redução nas exportações brasileiras para a China no curto prazo parecem em linha com essas projeções.

Antes do acordo EUA–China, a Abiove previa exportações brasileiras para o mercado chinês de 84 milhões de toneladas em 2025, contra 72 milhões em 2024. Por uma projeção conservadora, mantendo novembro e dezembro nos mesmos níveis do ano passado, o volume anualizado de 2025 poderia ficar agora em 82 milhões de toneladas, já considerando o impacto do novo acordo.

Assim, nota Nassar, o Brasil ainda deverá exportar 10 milhões de toneladas a mais que no ano passado, mesmo com o retorno da soja americana ao mercado chinês.

Para 2026, se o fluxo EUA–China se normalizar, a projeção é de recuo das vendas brasileiras para 72 a 75 milhões de toneladas, uma queda de 7 a 10 milhões de toneladas em relação ao ano de 2025.

É preciso levar em conta outros fatores que pressionam o setor, como a concorrência da Argentina, com projeção de 17% mais exportações em 2025–26 e disputando mercados alternativos à China.

Quando o acordo EUA–China foi anunciado, há duas semanas, o secretário do Tesouro, Scott Bessent, declarou: “Nossos grandes produtores de soja, que os chineses usaram como peões políticos, estão fora de questão. Eles devem prosperar nos próximos anos.”

No entanto, reportagem do Wall Street Journal mostrou que muitos agricultores americanos ainda se sentem como “peões”. Eles temem que as tensões entre Pequim e Washington voltem a se agravar, colocando novamente os produtores de soja em situação delicada. Seguem vulneráveis a uma nova escalada que poderia desfazer o acordo Trump–Xi.

Um dos agricultores entrevistados observou que, embora o acordo possa ajudar as finanças no curto prazo, ele não resolve o desafio estrutural: o Brasil. O país ultrapassou os EUA como maior exportador mundial de soja há mais de uma década, impulsionado por investimentos e pela abundância de terras aráveis.

“O Brasil continua se expandindo a cada ano — eles têm terras e mão de obra baratas, além de alguns agricultores muito perspicazes por lá”, disse o produtor ao WSJ.

A incerteza persiste em um momento ruim para os sojicultores americanos, que enfrentam custos crescentes e preços deprimidos. E tentam acelerar a busca por novos mercados.

Segundo o Wall Street Journal, processadores de ração e empresas de alimentos da Tailândia, tradicionalmente compradores do Brasil, aumentaram as aquisições de soja dos EUA. Bangladesh, Paquistão e países europeus também estão ampliando suas compras, enquanto Egito e Marrocos despontam como mercados de crescimento potencial, na visão americana.

Assis Moreira – Valor Econômico
 

Veja mais